segunda-feira, 29 de outubro de 2012

SIGNIFICADO E USO DAS PARÁBOLAS NO ENSINO DE JESUS


SIGNIFICADO E USO DAS PARÁBOLAS NO ENSINO DE JESUS

Jorge, Antonio Rafael Coelho (ETCS)

1 Introdução

            As parábolas são uma forma de ensino muito comum no ministério de Jesus e por isso de extrema importância para a compreensão de sua mensagem. Mateus assim escreve: “Todas estas coisas disse Jesus às multidões por parábolas e sem parábolas nada lhes dizia; para que se cumprisse o que foi dito por intermédio do profeta: Abrirei em parábolas a minha boca; publicarei coisas ocultas desde a criação [do mundo]” (Mateus 13:34-35).
            As parábolas constituem um terço do ensino de Jesus nos evangelhos sinóticos (Osborne, 2009) e por isso devem ser estudadas com cuidado e bastante precisão para se entender o seu significado. O uso que Jesus faz das parábolas pode ser devido a sua simplicidade em entendimento para o público em geral, pois geralmente eram histórias extraídas da realidade diária que produziam no público uma identificação com as personagens (Kaiser & Silva, 2009).
            Por isso, devido ao seu contexto histórico-cultural as parábolas muitas vezes são mal compreendidas em nossos dias, esse ensaio por sua vez, tem como objetivo mostrar métodos de interpretação hermenêutica para uma melhor compreensão das parábolas em sua verdadeira essência. 

2 O que são parábolas?

            Antes de entender o significado que as parábolas possuem no ensinamento de Jesus, precisamos compreender o que significa parábolas. Muitos autores se propuseram a definir esse recurso bastante utilizado no ministério de Jesus, e sabemos que não é uma tarefa fácil definir esse método complexo de ensino como as parábolas. De acordo com o dicionário bíblico universal, Bucklan & Williams (2007, p.446):

“Parábola é uma narrativa imaginária ou verdadeira que se apresenta com o fim de ensinar uma verdade. Difere do provérbio porque sua apresentação não é tão concentrada como a daquele; contém mais pormenores, exigindo menor esforço mental para ser compreendida. Difere da alegoria, porque esta personifica atributos e as próprias qualidades, ao passo que a parábola nos faz ver as pessoas na sua maneira de proceder e viver, também difere da fábula, visto que a parábola se limita ao que é humano e possível.”

            A parábola, então, envolve muitos elementos da vida diária e corresponde uma história que é facilmente entendida por seus ouvintes. Segundo George Eldon Ladd (2003, p.126) “uma parábola é uma estória extraída da vida diária, com a finalidade de comunicar uma verdade de cunho moral ou religioso”. Logo, as parábolas são recursos que quando empregados no ensino de Jesus, deve-se ter em consideração todo o contexto histórico empregado no processo narrativo para sua compreensão correta.
            De acordo com Joachim Jeremias (2007), as parábolas devem ser entendidas tento em seu contexto histórico como em toda a mensagem de Jesus e que delas deve ser extraído uma única ideia, sendo esta a mais geral possível. As parábolas apresentam tanto o contexto histórico, que deve ser entendido na vida diária das pessoas, quanto um contexto do ministério de Jesus, e a partir de ambos o único significado deve ser extraído, segundo Joachim Jeremias (2007, p. 15):

“As parábolas de Jesus não são - em todo caso não primariamente – obras de arte, nem querem inculcar somente princípios gerais, mas cada uma delas foi pronunciada numa situação concreta da vida de Jesus, situação única e muitas vezes imprevista. Muitas vezes, e até mesmo no mais das vezes, trata-se aí, como veremos, de situações de conflito, de justificação, de defesa, de ataque e até mesmo de desafio: as parábolas são, não exclusivamente, mas em grande parte armas de luta. Cada uma delas exige uma resposta concreta e imediata.”      
           
Esse método de ensino utilizado por Jesus não era uma inovação em seus dias, alguns dos principais mestres da lei eram conhecidos pela habilidade de construir esses tipos de histórias com o objetivo de ensinar alguma lição de moral (Tenney, 2008). Os maiores rabinos nos dias de Cristo eram especialistas no mashal, que consiste em tomar uma situação da vida real e moldar essa verdade de forma a extrair um princípio geral, ou seja, fornecer ao público em ensinamento entendível para dele ser compreendida uma lição moral ou espiritual (Daniel-Hops, 2008). Jesus certamente conhecia esse método de ensino e com sua autoridade assim o empregou nas parábolas.  
Contudo, as parábolas nem sempre foram entendidas dessa maneira direta e simples. Nos primeiros séculos após a morte de Cristo, as parábolas sofreram diversas formas de interpretação inadequadas e impróprias. Muitas delas foram tratadas muito tempo como alegorias, estendendo-se essa forma de interpretação pelos séculos adiante e ocultando assim o real sentido desse recurso (Jeremias, 2007). Agostinho, por exemplo, fez uma interpretação muito alegórica da parábola do Bom Samaritano, atribuindo significado a elementos do texto que distanciam completamente o leitor da verdade que Jesus procurou transmitir (Fee & Stuart, 1997).
Em vista disso, as parábolas são recursos literários muito difíceis de ser definido, pois tal conceituação pode ofuscar o seu real uso como método de ensino no ministério de Jesus. Porém, sabemos que a sua interpretação é única e necessita de seu contexto histórico para ser mais bem entendida e assim não desviar seu significado para alegorias ou sentidos que Jesus jamais pensou em transmitir.

3 As principais características das parábolas

Jesus ensinou grande parte do seu ministério através de parábolas. As parábolas, como dito anteriormente, são histórias com elementos da vida diária com o intuito de transmitir uma verdade espiritual, porém Jesus disse aos seus discípulos: “A vós é confiado o mistério do reino de Deus, mas aos de fora tudo se lhes diz por parábolas; para que vendo, vejam, e não percebam; e ouvindo, ouçam, e não entendam; para que não se convertam e sejam perdoados” (Mc. 4:11-12). Essa declaração de Jesus não significa que Ele queria ocultar a verdade aos que não pertenciam ao seu círculo de discípulos, mas produzia nos ouvintes uma ausência de compreensão do real significado do seu ministério, pois compreendiam a história, mas não reagiam favoravelmente as palavras de Jesus (Fee & Stuart, 1997), além de tronar-se instrumento de julgamento (Kaiser & Silva, 2009) para os corações endurecidos de seus ouvintes.
O principal objetivo da parábola era confrontar o público a tomar uma decisão ou a favor ou contra o ministério de Jesus, enquanto que para os discípulos elas transmitiam verdades espirituais que os confrontavam a crescer espiritualmente (Osborne, 2009). Além disso, as parábolas são instrumentos de Deus para a revelação de sua verdade ao seu povo (Kaiser & Silva, 2009). Portanto, as parábolas confrontam o homem caído a reagir ao Deus que trouxe a salvação através de seu filho Jesus Cristo e transmitem as verdades eternas antes ocultas aos homens.
 Por isso as parábolas são narrativas simples e de fácil compreensão (Kaiser & Silva, 2009). A forma que é contada cativa o ouvinte e o faz refletir acerca de seus atos (Fee & Stuart, 1997). Por exemplo, temos a parábola do Bom Samaritano (Lc. 10:25-37) que Jesus narrou em resposta ao doutor da lei que perguntou quem era o seu próximo, constituindo uma estória de um enredo simples e de fácil compreensão. Porém, devido a nossa distância temporal e cultural muitas vezes não compreendemos a verdade por trás de uma parábola, para isso temos que tentar reconstruir todo esse cenário histórico para chegar ao sentido original das parábolas de Jesus (Jeremias, 2007).
George Eldon Ladd (2003) cita dois cânones de interpretação necessários para uma compreensão histórica das parábolas. O primeiro determina que as parábolas não devem ser interpretadas como se fossem alegorias. Segundo Kaiser e Silva (2009), “alegoria é uma metáfora estendida, enquanto que parábola é um símile estendido”, ou seja, é uma comparação expressa e afirmada. O segundo princípio de interpretação determina que as parábolas devem ser interpretadas dentro do contexto histórico da vida e do ministério de Jesus, e não na vida da igreja (Ladd, 2003).
Outra característica importante das parábolas é a identificação dos pontos de referência que levam o ouvinte a compreender a moral de toda a história (Fee & Stuart, 1997). As parábolas muitas vezes são enriquecidas com alguns detalhes que são sem importância para a transmissão de seu significado, muitas vezes usado somente para enfatizar uma verdade. As parábolas apresentam somente um único ponto importante, uma única mensagem ou ponto fundamental, desafiando o leitor a responder conforme essa verdade lhe confronta (Osborne, 2009). Como por exemplo, a parábola do Filho Pródigo (Lc. 15:11-32) que centraliza o amor e a graça de Deus e produz no ouvinte uma reação a esse tamanho amor derramado pelo pai em direção ao seu filho pródigo (Ladd, 2003).
Algumas parábolas são repetidas e proferidas em situações diferentes por Jesus. Jesus em seu ministério pela Palestina muitas vezes usava as parábolas em mais de um lugar, dependendo de seu público e do ensinamento que queria transmitir. Por exemplo, a parábola da ovelha perdida é usada em Mateus 12:12-14 para os discípulos e em Lucas 15:1-7 para os fariseus (Osborne, 2009). Por isso, jamais devemos retirar a parábola de seu cenário histórico e da disposição que o evangelista organizou em sua narrativa nos evangelhos, pois por serem passagens bíblicas devem ser interpretadas dentro de seu contexto (Fee & Stuart, 1997).
            Em vista disso, precisamos ter em mente a forma como os evangelistas organizaram as suas narrativas e a maneira em que eles utilizaram essas parábolas dentro de seus relatos (Kaiser & Silva, 2009). Para uma melhor compreensão da mensagem de Jesus, o ideal seria ler o evangelho de uma única vez, de forma a compreender toda a mensagem e assim entender as parábolas dentro de seu contexto maior, levando em consideração a essência que o autor bíblico transmitiu em toda sua obra (France, 2009).
            A presença do reino de Deus é outra característica importante nas parábolas e necessária para sua compreensão. O ministério de Jesus inaugurou uma nova era em que o reino entrou de forma oculta, atuando secretamente entre os homens na esfera histórica do mundo, ou seja, “cumprimento sem consumação” (Ladd, 2003). Algumas parábolas descrevem o processo atual de crescimento do reino, como a parábola da semente de mostarda (Mc. 4:30-32) ou o fermento (Mt. 13:33); a necessidade de estar sempre alerta, como a parábola das dez virgens (Mt. 25:1-13); o uso correto dos bens terrestres, como demonstrado pela parábola do mordomo infiel (Lc. 16:1-12) e a necessidade do uso coreto dos dons, pois todas as obras serão julgadas, visto na parábola dos talentos (Mt. 25:14-30).
            As parábolas nos revelam verdades eternas transmitidas através do ensinamento único de Jesus. Durante seu ministério, Cristo, proclamou o arrependimento e o perdão dos pecados de todos aqueles que depositassem toda a confiança Nele. Por isso, suas parábolas exerceram um papel fundamental na proclamação da salvação, exigindo uma resposta urgente do público que ouvia suas palavras (Osborne, 2009). As parábolas de Lucas 15, da ovelha perdida, dracma perdido e do filho pródigo, demonstram claramente o poder gracioso de Deus de perdoar e salvar pecadores, exigindo uma única resposta do público, ou de aceitação ou de rejeição.
            Em suma, as parábolas eram narrativas que utilizam elementos do cotidiano para transmitir verdades espirituais, e por isso produzia uma reação no ouvinte que compreendiam a “moral da história”, mas ignoravam o sentido total do ministério de Jesus, tornando-se para esses, instrumento de julgamento; e para os discípulos um meio para o crescimento e aperfeiçoamento na verdade. As parábolas também devem ser compreendidas dentro de seu contexto histórico e dentro da disposição que o evangelista organizou na obra, além da importância do o reino de Deus que foi inaugurado no ministério de Jesus. Todas essas características são importantes e devem ser levadas em consideração para uma interpretação adequada das parábolas de Jesus.

4 Princípios hermenêuticos

            A interpretação adequada de uma parábola é de extrema importância, pois somente depois de entendida é que ela poderá ser aplicada em nossas vidas. A hermenêutica, com seus métodos, contribui grandemente nesse processo e por isso não devemos negligenciá-los durante esse processo interpretativo. Grant Osborne (2009, p. 386) nos diz a respeito:

“Sem uma interpretação perde-se o poder da parábola, porque toda parábola deve ser compreendida antes de ser aplicada. Seu “poder evocativo” é melhor discernido quando se entende o que Jesus pretendeu; isto é, de acordo com o pano de fundo do século I e com o contexto do próprio Evangelho. De qualquer modo, não devemos reduzir a parábola a uma simples análise palavra por palavra. É preciso preservá-la para que sua capacidade de surpreender e comover o ouvinte não se perca.”

            De acordo com Gordon Fee (1997) a identificação dos pontos de referências é que leva o ouvinte ou leitor a captar a lição de uma parábola. Esses pontos de referências são as partes da história que permite ao ouvinte penetrar nesse universo ficcional, de tal maneira que permite a sua identificação completa com os personagens ou elementos presentes na história. A lição ou moral da história encontra-se na resposta pretendida (Fee & Stuart, 1997).
            A identificação do auditório é outro ponto importante enfatizado por Gordon Fee (1997). Visto que, os ouvintes a quem Jesus dirigiu a parábola geralmente estão interessados em algum ponto específico de seu ensino, conforme a descrição no relato dos Evangelhos. A reconstrução desse cenário em que a parábola foi originalmente ouvida é importante para a identificação dos pontos de referências e com os ouvintes originais ouviram e reagiram a história (Fee & Stuart, 1997).
Segundo Grant Osborne (2009) alguns princípios hermenêuticos devem ser considerados para um processo interpretativo adequado de uma parábola. Em primeiro lugar ele recomenda a observação do cenário no qual a parábola se situa, ou seja o contexto tanto da vida e ministério de Jesus quanto da disposição dentro do Evangelho, assim como também o público ouvinte da histórica. Em segundo, Osborne recomenda o estudo da estrutura da parábola, observar os pontos de referências, o estilo narrativo, as viradas inesperadas, o clímax e as ações dos personagens dentro da história.
Osborne (2009) recomenda alguns outros princípios, como a compreensão do contexto histórica da Palestina nos dias de Cresto, visto que as parábolas sempre possuírem como pano de fundo algum evento do cotidiano do público a quem esta está sendo direcionada. Gordon Fee (1997) recomenda que se faça uma tradução da parábola para o nosso contexto, ou seja uma reformulação com novos pontos de referência para reproduzir a reação similar dos primeiros ouvintes.
Outro princípio para uma interpretação, segundo Osborne (2009), consiste em determinar os pontos principais de uma parábola, sendo esses pontos geralmente relacionados ao contexto em que a parábola se encontra. Em seguida, Osborne recomenda que se relacione os pontos ao ensino do reino por Jesus e à mensagem básica de cada evangelho, observando sempre o contexto literário.
Por fim, Osborne (2009), aconselha o leitor a não buscar fundamentos para doutrinas tendo com base as parábolas, pois nesse caso o melhor seria o estudo sistemático para uma melhor fundamentação. Osborne também recomenda a aplicação das ideias centrais em nossa vida cotidiana e também que o pregador deve analisar a parábola de maneira integral, sem fragmentação, para assim transmitir seu sentido ideal conforme foi pronunciada por Jesus.
É necessário, então, mais cuidado durante o processo interpretativo de uma parábola. O leitor na busca de uma compreensão mais adequada e real do ensino de Jesus deve estar disposto a buscar os pontos de referências e reconstruir todo o cenário original em que a parábola foi apresentada por Cristo aos seus ouvintes. O nosso contexto por se encontrar tão distante do original atrapalha a nossa compreensão da reação do público e uma reconstrução do cenário para os nossos dias seria de uma grande ajuda para um melhor entendimento.

5 Uma análise da parábola do Bom Samaritano (Lc. 10:25-37)

            O cristianismo primitivo mesmo com seus brilhantes teólogos, interpretou grande parte das parábolas de maneira alegórica, fugindo completamente da verdade o qual Jesus procurou transmitir. Agostinho, por exemplo, alegorizou a parábola do Bom Samaritano, atribuindo significado aos elementos presentes na parábola que distancia grandemente o real significado desta (Fee & Stuart, 1997).
            Segundo J. C. Ryle (2002, p.179) a parábola do Bom Samaritano “tem por objetivo mostrar a natureza do verdadeiro amor fraternal. Perder de vista este objetivo e procurar alegorias profundas na parábola equivale a vulgarizar as Escrituras e privar nossas almas de valiosas lições”. Portanto, devemos cautelosamente analisar essa parábola sempre baseado em todos os princípios hermenêuticos já citados anteriormente.
            Observando o cenário da parábola vemos que Jesus está discutindo com um certo intérprete da lei acerca da qualificação para a vida eterna. Jesus responde ao homem com uma pergunta voltada para o que se encontra escrito na Lei Mosaica, apresentando a mesma resposta dada por Jesus em Marcos 12:29-31 (Marshall, 2009). O intérprete da lei resume toda ela em amar a Deus acima de todas as coisas e o próximo como a ti mesmo. Segundo Marshall (2009, p. 1502) “o intérprete foi humilhado por essa resposta, e tentou recuperar forças ao pedir uma definição mais precisa da palavra próximo”.
            Jesus, então, em resposta a pergunta do intérprete da lei “Quem é meu próximo?” conta então a parábola do Bom Samaritano. Na parábola há somente dois pontos de referências: o homem deixado semimorto no caminho e o samaritano (Fee & Stuart, 1997). A estrada por qual o homem descia de Jerusalém para Jericó, era uma estrada solitária, de 27 quilômetros, bastante perigosa devido à susceptibilidade aos assaltos (Jeremias, 2007). Outro detalhe interessante era que nessa região moravam alguns sacerdotes que longe dos afazeres do templo muitas vezes transitavam por esses caminhos (Marshall, 2009).
            Portanto, após o homem ter sido assaltado e deixado em estado miserável, Jesus introduz a figura de dois tipos sacerdotais, um sacerdote e um levita, sendo que a atitude dos dois é mesma, ou seja, ignorar o tal homem. Dois pontos importantes precisam ser notados: Jesus contrasta a classe sacerdotal com os fariseus e rabinos, que são os peritos na Lei e os fariseus amavam o próximo através de suas ofertas aos mais pobres (Fee & Stuart, 1997). Esse fato poderá ter feito o intérprete da lei a pensar que Jesus em seguida introduziria um fariseu na história para exercer finalmente misericórdia para com o homem (Fee & Stuart, 1997), enquanto que a platéia provavelmente esperava um judeu leigo (Jeremias, 2007).
            Contudo, Jesus introduz uma figura inesperada. Os samaritanos eram vistos pelos judeus como um povo impuro e indesejável, e por isso nutriam um ódio imenso por esse povo (Daniel-Hops, 2008). Alguns judeus acreditavam que os samaritanos eram descendentes do povo assírio que ocupou Israel durante o exílio babilônico, que através de casamento misto se introduziram na cultura israelita e colocaram ídolos no santuário do povo de Israel. Além disso, os samaritanos se opuseram a reconstrução da nação liderada por Esdras (Coleman, 1991). Durante a profanação do templo por Antíoco Epifânio IV, obrigando os judeus a sacrificar porcos no templo e adorar deuses pagãs, os samaritanos obedeceram integralmente às ordens de Antíoco e negaram seus antecedentes judaicos, aumentado ainda mais o ódio que os judeus viam acumulando por esse povo (Tenney, 2010).
            Portanto, nos dias de Cristo o ódio dos judeus pelos samaritanos havia alcançado o seu clímax, em certa ocasião os samaritanos atiraram ossos humanos no santuário do templo, profanando o lugar e impedido o seu uso (Daniel-Hops, 2008). Segundo Henri Daniel- Hops (2008, p. 54), “um provérbio corrente, registrado no Talmude, dizia que um pedaço de pão dado por um samaritano era mais impuro do que carne de porco. Partindo, então, desses fatos históricos podemos ter uma noção da posição do samaritano entre os judeus e porque Jesus então introduz esse personagem na parábola.
            O samaritano, ao contrário do sacerdote, ao ver o homem ferido cuidou de seus ferimentos, levou-o para uma hospedaria e tratou dele, no dia seguinte ordenou ao hospedeiro que cuidasse do homem e pagou por esse serviço. Jesus ao escolher o samaritano usou um exemplo extremo, segundo Marshall (2009, p. 1502) “para mostrar como até mesmo um samaritano pode estar mais perto do Reino do que um judeu piedoso, mas pouco caridoso”.
            Jesus, então, ao responder a pergunta do intérprete da lei com essa parábola desmascara completamente toda a justiça própria que tinha esse homem no seu coração. Jesus declara a falta de conhecimento que tinham esses mestres da lei em relação ao verdadeiro amor ao próximo, que não pode ser definido em termos limitantes (Fee & Stuart, 1997). Jesus então expõe o comportamento dos judeus que se achavam caridosos no ato de dar esmolas, porém faltava completamente o amor nesses atos. O intérprete não necessitava de conhecimento, mas de um novo coração (Marshall, 2009).
            Portanto, o verdadeiro significado da parábola do Bom Samaritano e demonstrar que o nosso “próximo” são as pessoas que se encontram em necessidade, sejam elas amigos ou não. Segundo J. Jeremias (2007, p. 204) “”próximo”, diz Jesus com esta parábola, com certeza deve ser para você primeiramente o seu concidadão, mas não só ele, com também todo aquele que precisar de sua ajuda”. A lição, então, da parábola é que nosso próximo é sempre o necessitado de ajuda e nossa bondade deve ser refletida em atos e em verdade (Ryle, 2002).

6 O que as parábolas significam hoje?

            Tendo em vista ao que foi dito anteriormente em relação ao nosso distanciamento cultural, temporal e histórico, muito da lição da parábola é perdido para o leitor no contexto atual. Os pontos de referências muitas vezes são obscuros e a tendência a se alegorizar as parábolas distanciam o leitor ainda mais da verdadeira lição que Jesus intentou transmitir (Fee & Stuart, 1997).
            Alguns autores, como Gordon Fee e Grant Osborne, recomendam que as parábolas sejam recontadas no contexto atual, com novos pontos de referências de tal maneira que o mesmo sentimento da platéia original seja experimentado pelo público moderno. Contudo, deve-se antes fazer uma exegese cuidadosa do texto antes de experimentar esse método (Fee & Stuart, 1997) e recontar a parábola à luz da informação histórica (Osborne, 2009).
            Portanto, instruir o leitor a buscar eventos históricos e culturais é de extrema importância para uma melhor compreensão das parábolas de Jesus. O leitor por sua vez ganha autonomia e compreende melhor o que Cristo quis dizer em seu ensino. A parábola do Bom Samaritano é um exemplo disso, pois muitos em nossos dias se dizem caridosos, mas se comportam como “sacerdotes” e “levitas” ao ver um necessitado (Ryle, 2002). Segundo J. C. Ryle (2002, p. 180) “a bondade sacrifical de coração, que não se preocupa com o custo envolvido em sua prática, é uma virtude bastante rara entre nós”. Em nossos dias tais atos são mais ainda desprezados pelo mundo, por isso os crentes precisam refletir mais essa natureza de amor sacrifical presente no Senhor Jesus transmitidos nessa parábola (Ryle, 2002).

7 Conclusão                  

            O ensino de Jesus foi registrado pelos evangelistas e grande parte dele foi dado por meio de parábolas. As parábolas foram ditas para transmitir uma verdade eterna e por isso usam elementos diários de tal forma que fosse facilmente entendida por todos. O problema é que ao longo da história sofreu alegorização e o trouxe conclusões que Jesus jamais pensou em transmitir (Fee & Stuart, 1997).
            Para um entendimento dos evangelhos é de fundamental importância uma boa interpretação das parábolas da maneira que Jesus ensinou aos seus ouvintes. As histórias contadas por Jesus geralmente eram direcionadas a plateia que ele tinha intenção de ensinar uma lição, por isso eram ensinos claros e concretos, para alguns era uma forma de crescimento já para outros era instrumento de julgamento (Kaiser & Silva, 2009).
            Portanto, um entendimento adequado das parábolas exige do leitor a identificação dos pontos de referências e do auditório alvo (Fee & Stuart, 1997), além do contexto histórico, cultural e social de Israel; o cenário, os pontos importantes da narrativa, da escatologia e ética do reino (Osborne, 2009) e o contexto literário que os escritores bíblicos localizaram a parábola no ministério de Jesus e na igreja primitiva (Kaiser & Silva, 2009). Por isso, tais princípios devem ser aplicados para uma melhor interpretação das parábolas.

8 Referências Bibliográficas

BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009.
BUCKLAND, A. R.; WILLIAMS, L. Dicionário Bíblico Universal. São Paulo: Editora Vida, 2007.
COLEMAN, W. L. Manual dos tempos e costumes bíblicos. Belo Horizonte: Editora Betânia, 1991.
DANIEL-ROPS, Henri. A vida diária nos tempos de Jesus. São Paulo: Vida Nova, 2008.
FEE, Gordon; STUART, Douglas. Entendes o que lês? São Paulo: Vida Nova, 1997.
FRANCE, R. T. “Como ler os evangelhos”. Em Comentário bíblico: Vida Nova. Eds. Carson, D. A.; France, R.T.; Motyer, J.A.; Wenham, G.J., p. 1346-1356. São Paulo: Vida Nova, 2009.
JEREMIAS, Joachim. As parábolas de Jesus. São Paulo: Paulus, 2007.
KAISER, Walter C.; SILVA, Moisés. Introdução à hermenêutica: como ouvir a palavra de Deus apesar dos ruídos de nossa época. São Paulo: Cultura Cristã, 2009.
LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2003.
MARSHALL, I. H. “Lucas”. Em Comentário bíblico: Vida Nova. Eds. Carson, D. A.; France, R.T.; Motyer, J.A.; Wenham, G.J., p. 1472-1535. São Paulo: Vida Nova, 2009.
OSBORNE, Grant. A Espiral hermenêutica. São Paulo: Vida Nova, 2009.
RYLE, J. C. Meditações no evangelho de Lucas. São Paulo: Editora Fiel, 2002.
TENNEY, M. C. O novo testamento sua origem e análise. São Paulo: Shedd Publicações, 2008.
TENNEY, M. C. Tempos do Novo Testamento. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus (CPAD), 2010.



3 comentários:

  1. ARÁBOLAS DO MESTRE

    Olá amigos!

    Jesus na sua imensa sabedoria deixou-nos ensinamentos intemporais e que quando bem utilizados tornam a nossa vida mais plena. Ele sabia que a melhor forma de revelar o coração do seu Pai aos homens era através de abordagens simples, de forma a serem compreendidas facilmente por nós todos.
    A maior expressão disto mesmo são as suas parábolas, que através do seu poder ilustrativo se apresentam para nós como verdadeiras lições de vida.
    Para melhor compreendermos qual o seu real significado é importante antes de tudo compreender qual é o significado da palavra Parábola. Assim, "Parábola", é originária da palavra grega, parabole, vem de um verbo grego que significa "atirar para o lado". Uma parábola é uma história que coloca uma coisa ao lado de outra com o propósito de ensinar. É uma comparação, colocando o conhecido ao lado do desconhecido. Uma narração alegórica que encerra algum preceito moral ou verdade importante.
    Devido à incerteza do que exatamente constitui uma parábola, as listas das parábolas de Jesus que têm sido compiladas variam em extensão de acordo com o julgamento do compilador. Mas de uma coisa se tem a certeza... Parábolas não são fábulas ou mitos, tampouco não há elementos irreais ou situações impossíveis nelas. Assim, a força das Parábolas está em serem absolutamente concebíveis e na plausibilidade das circunstâncias que elas descrevem. Elas falam de situações familiares, da vida real.
    Este texto é então somente o começo do meu singelo presente de Natal para todos os amigos deste fórum, de forma a refectirmos em conjunto nestas narrativas maravilhosas que nos convidam a olhar para Deus. Espero que gostem!

    Beijinhos
    Andreia

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  2. ARÁBOLAS DO MESTRE

    Olá amigos!

    Jesus na sua imensa sabedoria deixou-nos ensinamentos intemporais e que quando bem utilizados tornam a nossa vida mais plena. Ele sabia que a melhor forma de revelar o coração do seu Pai aos homens era através de abordagens simples, de forma a serem compreendidas facilmente por nós todos.
    A maior expressão disto mesmo são as suas parábolas, que através do seu poder ilustrativo se apresentam para nós como verdadeiras lições de vida.
    Para melhor compreendermos qual o seu real significado é importante antes de tudo compreender qual é o significado da palavra Parábola. Assim, "Parábola", é originária da palavra grega, parabole, vem de um verbo grego que significa "atirar para o lado". Uma parábola é uma história que coloca uma coisa ao lado de outra com o propósito de ensinar. É uma comparação, colocando o conhecido ao lado do desconhecido. Uma narração alegórica que encerra algum preceito moral ou verdade importante.
    Devido à incerteza do que exatamente constitui uma parábola, as listas das parábolas de Jesus que têm sido compiladas variam em extensão de acordo com o julgamento do compilador. Mas de uma coisa se tem a certeza... Parábolas não são fábulas ou mitos, tampouco não há elementos irreais ou situações impossíveis nelas. Assim, a força das Parábolas está em serem absolutamente concebíveis e na plausibilidade das circunstâncias que elas descrevem. Elas falam de situações familiares, da vida real.
    Este texto é então somente o começo do meu singelo presente de Natal para todos os amigos deste fórum, de forma a refectirmos em conjunto nestas narrativas maravilhosas que nos convidam a olhar para Deus. Espero que gostem!

    Beijinhos
    Andreia

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